quarta-feira, 21 de setembro de 2016

Até que nossa indignação separe-os, Amém!


A união entre Estado e religião nunca foi nenhum segredo para os brasileiros, e isso está cada vez mais intrínseco, difícil de separar. Ora, vemos o Estado enrustido em cerimônias e atividades religiosas, o que contraria o conceito de um Estado laico que se opunha ao envolvimento com religiões; ora, a igreja, com seu cristianismo culpado que mais parece um fardo aos seus fiéis, se enraíza nas instâncias governamentais como uma forma de ampliar e determinar decisões que a favoreça.
            Nos últimos meses temos acompanhado nos meios de comunicação a divulgação da Campanha da fraternidade 2012 que tem como tema “Que a saúde se difunda pela Terra”. Divulgada incessantemente nas mídias, a CF2012, como é chamada a campanha que é fruto de articulações da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil) com o governo brasileiro, propõe à sociedade brasileira uma discussão atual sobre saúde e o Sistema único de saúde – SUS que funciona em condições precárias de atendimento ao público. A discussão deve se estender por todo o período quaresmal, culminando com a arrecadação de milhares de envelopes recheados de dinheiro do povo, de seguidores fiéis à igreja católica, que, em grande parte mal sabem o destino do dinheiro arrecadado.
            Fala-se de CF2012 nas escolas durante quarenta dias com a intenção de enganar as mentes frescas de nossos jovens, com a falsa impressão de que o povo é responsável por sua saúde, como se saúde pública fosse uma aventura solitária em que cada um é responsável por está saudável, o que não deixa de ser verdade, mas saúde pública, de acordo com a situação atual do SUS e das pessoas que necessitam do atendimento gratuito, é uma questão de investimento em hospitais, pessoal qualificado, atendimento humanizado e, acima de tudo, educação de qualidade para o povo porque ser saudável não é só uma questão de patologia, mas de circunstâncias sociais. Acredito que muitas doenças são causadas por uma má alimentação, como a obesidade, hipertensão, etc. Como propor ao povo que cuide de sua saúde se, muitos brasileiros não tem escolha, comem qualquer tipo de alimento sem muitos cuidados, quando há alimento? Como pedir que lave bem um alimento se mal tem água para beber ou atender às suas necessidades básicas? E ainda divulgam que o povo é responsável por estar doente. Se isso ocorre é porque não houve educação de qualidade e suficiente para fazer com o povo cuidasse melhor de si em todos os sentidos da vida, o que evitaria o abarrotamento de tantos hospitais públicos com doentes a espera de atendimento.
            A CF2012 é mais uma prova da ineficiência do Estado brasileiro que não cumpre com o que reger a constituição brasileira de 1988, no artigo 6º que aponta os direitos fundamentais à garantia de perfeitas condições de vida como saúde, educação, trabalho, alimentação, etc. Assim, o Estado se diz operante com uma falsa parceria que retira de seu campo de responsabilidade uma questão/prioridade para o bem do povo, a saúde pública. A CF2012 quer desvincular, salvar e trucar a imagem do Estado brasileiro fazendo o papel que não lhe compete, mas que por interesses políticos, certamente, o faz como desde sempre já que a imagem de Estado laico é apenas subjacente ao que realmente importa na relação mais que “amiga” entre poder governamental e poder eclesiástico.
            De longe esta iniciativa merece meia dúzia de aplausos, pois não prioriza a educação e sim o combate material que não respeita os limites históricos, culturais, econômicos e sociais do povo brasileiro. É uma empreitada que na prática, com pessoas muito pobres que vivem abaixo da linha da pobreza, não tem eficácia. Viver na miséria é não ter acesso a programas econômicos-sociais, a infraestrutura, acesso a rede pública de saúde, à atendimento humanizado nos hospitais, ausência de rede de tratamento de esgoto, entre outras coisas. Embora tudo isso seja mínimo diante dos olhos do governo, a CF2012 continua difundindo que a saúde do povo é uma questão que deve ser resolvida pelo povo e não pelo governo, o que perpetua a mascarada união entre igreja e Estado.
Vemos todos os dias, nas TVs e internet, pessoas desviando dinheiro que deveria ser empregado no SUS, para atender melhor a população, o que não é novidade, mas é fruto de um comportamento gerado pelo sistema corrupto gerenciado em Brasília onde sustentamos uma centena de deputados e senadores que pouco fazem pelo povo mais pelo próprio bolso. É para lá que vai a maior parte de nossos impostos que sustentam toda a corja do sistema que massacra o povo quando decidem por seus próprios interesses, deixando de dar aos brasileiros melhores condições de vida como já garante a Constituição Federal de 1988.
O povo só será capaz de cuidar de si próprio quando tiver educação com qualidade, oportunidades iguais que lhe garanta alimentação digna todos os dias e acesso às informações geradas com a finalidade de educar para a vida e não apenas para atender a interesses temporários que visam lucros e a falsa sensação de proteção e eficiência. Saúde pública não é apenas direito fundamental, mas também condição primeira para que se possa exercer todas as prerrogativas que deveriam gozar todos os valentes cidadãos deste país.

Março de 2012.

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